sábado, 11 de outubro de 2014

OPERAÇÃO  GAVIÃO
Relatório da Operação
De 17/9/70 a 30/9/70
3 Oficiais, 4 Sargentos, 65 Praças.
Estacionamentos em: Montepuez, Nairoto, e Nakatari.
Em Mueda foi montado acampamento.
Efectuada operação Gavião de 23/9/70 a 26/9/70.
Resultados: Positivos – Capturada população civil 10 crianças e uma mulher
Negativos- Guia nativo ferido com gravidade em emboscada sem outras     consequências. Evacuação efectuada por Heli.
Durante a operação foi montado um posto de relé de rádio em casa civil para apoio ao Destacamento.
Regresso em coluna no dia 29/9/70 ás 06 e 30h. Chegada a Porto Amélia  a 30/9/70 ás 01 e 30h

Ou, como estive sobre prisão na varanda de um 1º andar

                Como acima foi dito, foi montado um posto rádio na varanda de um edifício civil para dar apoio ao destacamento enquanto este cumpria a operação.
                Como sabe quem esteve em África e principalmente em Mueda, os dias são muito quentes e as noites muito frias. Atendendo que eu era o único telegrafista estive sempre de serviço durante os 3 dias da operação.
                No segundo dia pelas 18h recebi  do Carlos Guilherme (o telegrafista que foi com o destacamento) um pedido urgente pois estavam a ser bombardeados pelos obuses de Mueda que estavam a cair muito próximos do local onde iriam pernoitar. Como é lógico dirigi-me imediatamente á Messe dos oficiais que distava uns 300 mts, tal e qual estava vestido. Entrei e perguntei a um ordenança quem era o oficial de Artilharia, tendo-me sido indicado um major vestido a rigor acompanhado por 2 senhoras. Dirigi-me a ele e antes que pudesse dizer palavra foi recebido nestes termos:
                O que é que fazes aqui seu maltrapilho? ( Convém acrescentar que eu ia de calções, chinelas e tronco nu) e virando-se para o ordenança disse: Quero este homem imediatamente sobre prisão, chame o cabo da guarda. Sem me deixar intimidar fiz a continência e entreguei a mensagem que trazia. O homem mudou de cor mas não voltou a trás com o que ele considerava uma enormíssima falta de respeito. Enquanto esperáva-mos pelo cabo da guarda lá fui explicando que não podia ser preso pois era o único telegrafista e tinha que voltar para o meu posto para comunicar ao meu comandante que já tinha entregue a mensagem. Nem assim  ele mudou de ideias e eu acabei por voltar para o meu posto com um sentinela e sob prisão, o que diga-se de passagem até deu jeito pois assim já podia ir á casa de banho sem me preocupar com possíveis chamadas.

                Quando o Destacamento voltou o comandante foi informado da ocorrência, não ligou à queixa do sr major e tudo voltou ao normal.

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Uma noite em moçambique

Uma noite em Moçambique

Ao longe o clarão sol a nascer no horizonte cega-nos. Cançados depois de toda uma noite caminhando, tropeçando, rasgando a carne nos ramos espinhosos, praguejando em silêncio, sentimo-nos agora sem forças para prosseguir.

O Comandante, finalmente, ordenou a tão desejada paragem e esses mesmos corpos derreados largaram-se ao abandono no chão duro desejando apenas não sentir. Os sentidos sempre alerta vão-se apercebendo dos ruídos da mata. Um ligeiro cheiro a fumo chega até nós. Estamos perto.
Quaise imediatamente e por sinais recebemos ordem para proceguir. Com muito esforço retomamos a marcha. A paragem foi de cinco minutos e serviu apenas para beber um gole de água e respirar fundo. O peso da mochila vinca-me os ombros e as pernas já não as sinto. Caminhamos à 16 horas no mato e estamos no fim das nossas reservas.

Começamos a andar ainda com mais cuidado, estamos em aproximação e a partir de agora qualquer erro pode ser fatal. Temos o cuidado de seguir as pegados do fuzo à nossa frente. De repente sinal de alto todos nos abaixamos com os sentidos alerta. Esperamos tensos, ansiosos e nervosos. Nova ordem para proceguir. O sol a subir no horizonte começa a aquecer o nosso corpo. Caminhamos na orla da mata paralelamente à picada. Apesar de ser mais fácil para caminhar ou está minada ou tem sentinelas. Novo alto. São cinco da manhã e a vida na povoação começa a despertar. Ouvem-se os galos e de quando em vez o grunhido de um porco.

Recebemos ordem para emboscar. Já somos veteranos cada um sabe o que tem de fazer. Os chefes de equipe reunem o seu pessoal e procuram o melhor local. Eu como telegrafista procuro um local seguro com o sargento enfermeiro e o meu guarda costas encostamo-nos a uma árvore e aguarda-mos. Ligo o Racal só com antena vertical para verificar se está a funcionar. Estas baterias não são de confiança e às vezes descarregam-se e eu só levo uma reserva. Pesam 3 kg e são muito incómodas de transportar.

Finalmente a ordem para atacar. Os Fuzos levantam-se aos gritos e desatam em louca correria na direção da povoação. Tudo acontece num momento. Atravessamos o espaço desprovido de árvores, atravessamo-lo e entramos na povoação. Está vazia, foi abandonada durante a noite, deixando apenas os animais e o lume feito. Devem-nos ter detectado durante a caminhada e resolveram abandonar o povoado levando o povo para outro local.

Revistamos as palhotas com cuidado por causa das armadilhas. Nada de armas e a comida era pouca. Incendiamos o povoado e saímos rápidamente da zona. Era custume lançarem granadas de morteiro para a propria povoação enquanto nós lá estáva-mos.

Afastámo-nos rápidamente alguns kilómetros e finalmente pudémos descançar. Agora teríamos que fazer o caminho de volta à base

Cancioneiro do Niassa Velhas picadas esburacadas Capim cerrado E o calor, sinto o suor Corpo cansado Moscas mosquitos Bichos esquisitos Ai é...