segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Uma noite em moçambique

Uma noite em Moçambique

Ao longe o clarão sol a nascer no horizonte cega-nos. Cançados depois de toda uma noite caminhando, tropeçando, rasgando a carne nos ramos espinhosos, praguejando em silêncio, sentimo-nos agora sem forças para prosseguir.

O Comandante, finalmente, ordenou a tão desejada paragem e esses mesmos corpos derreados largaram-se ao abandono no chão duro desejando apenas não sentir. Os sentidos sempre alerta vão-se apercebendo dos ruídos da mata. Um ligeiro cheiro a fumo chega até nós. Estamos perto.
Quaise imediatamente e por sinais recebemos ordem para proceguir. Com muito esforço retomamos a marcha. A paragem foi de cinco minutos e serviu apenas para beber um gole de água e respirar fundo. O peso da mochila vinca-me os ombros e as pernas já não as sinto. Caminhamos à 16 horas no mato e estamos no fim das nossas reservas.

Começamos a andar ainda com mais cuidado, estamos em aproximação e a partir de agora qualquer erro pode ser fatal. Temos o cuidado de seguir as pegados do fuzo à nossa frente. De repente sinal de alto todos nos abaixamos com os sentidos alerta. Esperamos tensos, ansiosos e nervosos. Nova ordem para proceguir. O sol a subir no horizonte começa a aquecer o nosso corpo. Caminhamos na orla da mata paralelamente à picada. Apesar de ser mais fácil para caminhar ou está minada ou tem sentinelas. Novo alto. São cinco da manhã e a vida na povoação começa a despertar. Ouvem-se os galos e de quando em vez o grunhido de um porco.

Recebemos ordem para emboscar. Já somos veteranos cada um sabe o que tem de fazer. Os chefes de equipe reunem o seu pessoal e procuram o melhor local. Eu como telegrafista procuro um local seguro com o sargento enfermeiro e o meu guarda costas encostamo-nos a uma árvore e aguarda-mos. Ligo o Racal só com antena vertical para verificar se está a funcionar. Estas baterias não são de confiança e às vezes descarregam-se e eu só levo uma reserva. Pesam 3 kg e são muito incómodas de transportar.

Finalmente a ordem para atacar. Os Fuzos levantam-se aos gritos e desatam em louca correria na direção da povoação. Tudo acontece num momento. Atravessamos o espaço desprovido de árvores, atravessamo-lo e entramos na povoação. Está vazia, foi abandonada durante a noite, deixando apenas os animais e o lume feito. Devem-nos ter detectado durante a caminhada e resolveram abandonar o povoado levando o povo para outro local.

Revistamos as palhotas com cuidado por causa das armadilhas. Nada de armas e a comida era pouca. Incendiamos o povoado e saímos rápidamente da zona. Era custume lançarem granadas de morteiro para a propria povoação enquanto nós lá estáva-mos.

Afastámo-nos rápidamente alguns kilómetros e finalmente pudémos descançar. Agora teríamos que fazer o caminho de volta à base

1 comentário:

  1. De quem é este relato, Luis? Teu ou de algum outro camarada do teu Destacamento?
    Um abraço daqui da Póvoa!

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Cancioneiro do Niassa Velhas picadas esburacadas Capim cerrado E o calor, sinto o suor Corpo cansado Moscas mosquitos Bichos esquisitos Ai é...