sábado, 21 de agosto de 2010

As memorias de um eis combatente No 6

Partida para uma viagem longa e cansativa por não haver nada que fazer, apesar de ser uma viagem comercial.
A primeira paragem foi no Funchal (uma chegada pela fresquinha da manhã), mesmo no cais e a espera de alguem que estivesse interessado numa corrida pela cidade, havia uns taxis bem velhinos mas muito bem estimados, seria como agora um Limousine. Uma cidade bem diferente numa ilha de que pouco tinha ouvido falar antes.
Saímos do barco por umas horas e fomos dar uma volta a pé pela baixa da cidade, pára-se para beber umas cervejas numa esplanada, visitam-se umas quantas lojas para apreciar os artigos artesanais, mais um dedo de conversa, mais umas voltas e vamos de regresso ao barco.
Mais algum tempo para sairmos do porto do Funchal, ora bem, um barco é um pouco diferente de um automóvel, enquanto um automóvel se estaciona e tira do estacionamento em segundos, um barco com este porte, e não era dos maiores, leva muitos minutos, por vezes horas para fazer estas manobras.
Faz-se a largada e a partir daqui é só comer e dormir durante sete dias e sete noites, foi o tempo que nos levou a chegar a S Tomé, só agua e céu e algumas gaivotas, muito poucas, era só o que se via, posso dizer que estava impressionado com tanta água.
Às vezes lá apareciam uns golfinhos, ou uns peixes voadores, tirando isso, água mais água, céu e mais céu, muitas vezes deitados ao sol no convés para passar o tempo.
Em S. Tomé não havia cais, para se ir a terra faziam-nos transportar num pequeno barco e lá fomos explorar o que era a ilha, aqui a pobreza evidenciava-se, o que era bem notável.
Algumas pretas tentando vender peças de artesanato regional, outras a tentar convencer-nos para irmos conhecer a palhota, mas nesta ainda passei, estava a começar a conhecer gente totalmente diferente do que estava habituado e as primeiras impressões não eram as melhores e por enquanto não me queria envolver com elas, talvez um pouco cedo.
Beberam-se algumas bebidas tradicionais e pouco mais, pois havia pouco que ver nesta ilha.
Daqui fomos até Luanda, uma beleza aquela entrada na baia de Luanda é como um sonho que não mais se esquece, qualquer coisa de inédito que só vendo se consegue perceber do que estou falando, aquela marginal vista de longe aqueles coqueiros ao longo da praia, creio nem em fotografia se consegue imaginar. Ficamos também por algum tempo na cidade, deu para visitar e conhecer um pouco.
Próxima paragem o Lobito, depois Moçamedes isto em Angola, estas cidades mais pequenas mas não sem coisas lindas para ver.
Cape Town e Durban na África do Sul, em todas estas cidades saímos por umas horas para visitar. Aqui e armados em turistas e sempre à civil, na África do Sul não poderíamos e por causas de pró formes políticos não devíamos sair fardados, alguns num grupo a que eu pertencia, andando pelas avenidas, na baixa de Cape Town. A certa altura levo um encontrão de um preto e lá se foram uns óculos baratos que levava no bolso de cima do casaco, ele numa fuga rápida sem perseguição.
Nesta viagem houve um membro do destacamento, na altura 2nd Sargento FZE José Francisco Valente Ramos, conheceu uma senhora Sul-africana que viajava creio desde Lisboa no mesmo barco, do qual mais tarde viriam a casar. No momento em que escrevo e por conhecimento, eles encontram-se a viver em Durban na África do Sul.
A próxima paragem Lourenço Marques, chegamos a tardinha o barco atracou ao cais e aqui havia dois casais na muralha a espera do barco, os meus dois irmãos mais velhos que se encontravam em Moçambique desde 1959 e as esposas. Foi uma pequena reunião de família.
Como aqui o barco só iria sair no dia seguinte andaram-me a mostrar a cidade. Em 1969 a cidade era linda aquela avenida da República, depois a continuação da marginal até à Costa do Sol, aqueles coqueiros e pinheiros mansos junto à praia um paisagem muito diferente.
Desta vez jantei com eles e fiquei fora até ao dia seguinte, se bem me lembro, creio termos jantado no restaurante da Costa do Sol.
No dia seguinte o reembarque rumo à Beira.
Tivemos que fazer o reconhecimento obrigatório do Moulin Rouge e todos os outros bares da zona. Era uma atracção turística desta cidade.
Não me lembro quanto tempo ficamos.
Novamente a bordo rumo a Nacala, foi o fim da viagem de barco e à despedida do paquete Angola. Viagem que terminou a 17 de Junho de 1969.
Por ser Junho não se notava muito a diferença na temperatura ambiental como estávamos no hemisfério sul, aqui estaríamos no inverno.
Estivemos um dia e uma noite na base dos Pára-quedistas, alguma convivência, um dedo de conversa, umas histórias de coisas passadas.
18/6/1969 Base aérea de Nacala, num Nor Atlas lá foi todo o pessoal, 80 homens de uma só vez dentro daquele menino, avião um pouco estranho devido a sua configuração.
Vila Cabral, uma viagem que durou cerca de uma hora e pouco, uma cidade pequena situada num planalto no norte de Moçambique para quem não saiba a capital da província do Niassa.
Niassa é um lago que se situa entre Moçambique e o Malawi (e mais a norte de Moçambique, a Tanzânia), lago de onde origina o nome da província, lago esse que irei falar mais daqui para a frente.
Tivemos que pernoitar, uns no aquartelamento da Marinha, outros, já se começavam a desenrascar e pernoitaram fora, assim como eu com a companhia do Arraza, que já conhecia Vila Cabral, pois era a sua segunda comissão e só tinha saído daqui há poucos meses, lá fomos os dois pernoitar fora, na palhota. Vila Cabral não parecia África, de noite passamos um frio que nem calculam.
Creio que no dia seguinte, e aqui não haveria autocarros que pudessem fazer esta viagem pela picada, transporte feito em camiões, rumo a Meponda. Meponda que seria o nosso ponto de embarque para a nossa última etapa da viagem.
Muitas peripécias pelo caminho. Um caminho muito longo derivado às condições da picada, em muito más condições, possivelmente sem alguma reparação já há uns anos, aqui já por prevenção e já em zona de combate armados para qualquer eventualidade. G3, cinco carregadores cheios, lá vamos.
Meponda era como se um porto de embarque e desembarque para tropas. Sem cais, só havia
uma pequena muralha em madeira que dava para as lanchas encostar, uma de cada lado.
Embarcamos em duas L F patrulhas rápidas que nos levaram ao destino.

Metangula.
O Paraíso do Niassa.

1 comentário:

  1. João, estás um escritor perfeito. É com grande interesse que leio as tuas crónicas, as quais trazem à memorias esses velhos tempos.
    Nesta viagem penso que falhou a passagem por Tenarife (Canárias),ilha também muito bonita.
    Quando íamos a regressar ao navio no funchal, por em andamento estar a olhar para umas garinas sentadas, bati violentamente com a cara de lado num poste metálico de iluminação. Quando chegamos a S.Tomé ,ainda me doía a cara.Um abraço, Godinho

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Cancioneiro do Niassa Velhas picadas esburacadas Capim cerrado E o calor, sinto o suor Corpo cansado Moscas mosquitos Bichos esquisitos Ai é...